Cada vez mais se fala em estética e em cirurgia estética, criando uma ideia globalizada das suas importância, facilidade, acessibilidade e necessidade.
É falso. É importante, mas não obrigatória. A sua facilidade está intimamente relacionada com cada doente e com cada procedimento em si, a qualidade tem preço e a necessidade deve ser ponderada entre a severidade do “defeito” e a expectativa em torno dos resultados.
Em tom de clarificação, poderemos, em primeiro lugar, tentar uma tarefa virtualmente impossível: definir o belo. A beleza, através do mundo que conhecemos, assume as mais variadas expressões, condicionadas culturalmente pelo olho do observador, com um espectro que varia ente a cara de um bebé, obras de arte, paisagens ou golos em jogos de futebol.
Beleza dá prazer olhar. Esse prazer está em nós, varia connosco. E seguramente varia com quem somos, de onde vimos e para onde vamos. Ao longo dos tempos, o seu único denominador comum será provavelmente a simetria.
A sociedade dos nossos dias valoriza cada vez mais o aspecto físico e, sobretudo, um estilo de vida de aparência jovem e saudável. Se per se este facto não acarreta nenhum mal, devemos não esquecer de que cada vez que for imposto ao indivíduo um certo modelo de homem, quer na vertente física – pela sociedade e pelo Estado – quer pela vertente espiritual – pela religião –, os resultados foram catastróficos. Assim, cabe ao médico, neste caso ao cirurgião plástico, desconstruir alguns mitos que a pressão da sociedade, com motivações claramente económicas, tem vindo a exercer sobre o ser humano – não temos de ser todos iguais, não temos de ser “perfeitos”, não temos de ser eternos, não existem milagres estéticos. Cabe-nos gerir as expectativas dos nossos doentes.
Não só não devemos ser todos iguais, como não podemos. Além de a beleza ser também diversidade, não é tecnicamente exequível através de quaisquer tratamentos médicos ou cirúrgicos tornar alguém igual a um outro.
Não temos de ser perfeitos, não o somos nem nunca o seremos. Não existem perfeição e, se vier a existir, nunca será resultado de tratamentos médicos ou cirúrgicos. A cirurgia plástica, na vertente estética, serve para melhorar algumas das nossas imperfeições, tornando-nos mais coerentes com a imagem que temos de nós próprios.
Não somos nem vamos ser eternos. Citando Pulido Valente, acerca da pressão do Estado sobre a obesidade, “ninguém tem a obrigação de ser um espécimen em bom funcionamento”. Todos vamos envelhecer e cabe a cada um de nós decidir como o fazer. A cirurgia estética apenas pode adequar o envelhecimento físico, mais rápido, ao cognitivo, mais lento.
Não existem milagres “estéticos”. Cada vez que é anunciada uma redução dramática da silhueta, numa única sessão, sem esforço e sem dor, é falso. Cada vez que for anunciado um creme milagroso, que apaga todas as rugas da face ou que faz aumentar a mama numa copa, é falso. Nada se consegue sem esforço.
Estamos a viver um tempo de desonestidade intelectual, tanto dos prestadores de serviços de “estética”, como dos consumidores.
É possível, recorrendo à cirurgia e a tratamentos estéticos, obter resultados dramaticamente positivos, com impacto real na auto-estima e na qualidade de vida dos pacientes, mas não mais do que isso. Para se aparentar um estilo de vida saudável é, na realidade, preciso levá-lo.
Lux, 2016
